terça-feira, 7 de agosto de 2012



Chove.
 
Há silêncio, porque a mesma chuva 
Não faz ruído senão com sossego. 
Chove. O céu dorme. 
Quando a alma é viúva 
Do que não sabe, o sentimento é cego. 
Chove. Meu ser (quem sou) renego... 
Tão calma é a chuva que se solta no ar 
(Nem parece de nuvens) que parece 
Que não é chuva, mas um sussurrar 
Que de si mesmo, ao sussurrar, se esquece. 
Chove. Nada apetece... 
Não paira vento, não há céu que eu sinta. 
Chove longínqua e indistintamente, 
Como uma coisa certa que nos minta, 
Como um grande desejo que nos mente. 
Chove. Nada em mim sente... 
-Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"-

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